A influência do Capitalismo no mundo do Design
Vivemos em uma sociedade na qual o consumo em massa, principal meio
para a satisfação das necessidades humanas, está ligado ao estilo de vida de
muitos. E o consumo só é como é hoje devido ao trabalho em equipe do
capitalismo com o designer o qual é responsável por toda a identidade visual da
empresa, produtos e divulgação. Sem o papel do designer, a venda e a compra não
seriam como são hoje.
Entre os séculos XVIII e XIX, ocorreram revoluções na tecnologia, na
organização de trabalho e nas relações dos meios de produção que modificaram o
meio industrial como um todo. Houve uma grande expansão no meio e na capacidade
produtiva por meio do surgimento das máquinas. Diante disso, os setores
industriais viram a necessidade de mudar o seu modo de venda e produção dos
seus produtos. Essas transformações deram o surgimento de teorias que têm o
objetivo de explicar o motivo dessas mudanças e o surgimento dos designers.
A necessidade do designer se deu início ao longo do século
XIX, quando o empresário teve que economizar ao máximo na sua mão de obra para
aumentar o seu lucro final. Porque não aumentar a produção através de uma
intensificação da atividade integrada de cada artesão? – Eles pensaram. Essa
pergunta foi respondida e sua resposta foi implantada no meio de produção a
partir da teoria dos alfinetes do economista escocês Adam Smith. De acordo com
Smith, se um homem tivesse que fabricar sozinho um alfinete, buscando a matéria
prima sozinho, irá demorar cerca de um mês na produção. Já um artesão hábil,
fabricaria certamente não mais do que vinte alfinetes por mês. Mas ao aplicar
essa teoria no processo de produção fabril, em que há divisão de trabalho, o
ganho de produtividade é maior. Smith descreve que a fábrica de alfinetes
funcionaria com um operário desenrolando o arame, outro o endireita, um
terceiro o corta, um quarto faz as pontas, um quinto o afia para colocar a
ponta. O filósofo destaca que para a produção de um alfinete é necessário, mais
ou menos, 18 ações distintas divididas entre 10 funcionários. Os mais
habilidosos, como o designer, executariam tarefas distintas, caracterizando uma
grande divisão de trabalho. Smith fala de três benefícios trazidos pela divisão
do trabalho:
- A especialização deixa o funcionário mais ágil, que por
consequência amplia a quantidade e a qualidade do produto;
- Economiza tempo, já que passar de uma tarefa para outra ao
longo do processo gera perda de concentração e de tempo;
- Possibilita a invenção e o aprimoramento das máquinas;
Implementando essa ideia no dia a dia do empresário,
antigamente ele tinha como mão de obra vários artesões que iriam fabricar um
certo tipo de produto manualmente, fazendo o papel do homem sozinho na teoria.
No entanto, como já dizia a teoria, demorava-se muito tempo para fabricar um
produto 100% artesanal, por isso, surgiu a necessidade da troca dos artesões
para um único designer que ficaria responsável pela criação de um projeto no
qual seria executado por operários sem qualquer qualificação e supervisionado
por um bom gerente. Portanto, essa mudança na produção em série representava
para o fabricante uma economia de tempo, de dinheiro e eliminava a necessidade
de empregar trabalhadores com um alto grau de capacitação técnica.
Com o passar dos anos o papel do designer no meio industrial
foi sendo alterado de acordo com a necessidade da empresa diante da venda do
produto e da sua relação com o cliente, como foi mostrado anteriormente. Em
conformidade com Paula Landim (2010), o design de um ponto de vista global
envolve a concepção e o planejamento dos produtos elaborados pelo homem para
melhorar sua qualidade de vida, como também, para alcançar um novo público
internacional devido o surgimento das empresas multinacionais. Mais do que
nunca, o design do produto passou a influenciar culturas. O designer não era
mais responsável somente pela diminuição do tempo, mas também, os desafios do
consumismo, enfrentados pelas empresas multinacionais, de lidar com diversos
tipos de culturas totalmente diferentes ao redor do mundo.
A priori, para se entender toda essa influência do design
sofrida por diversas teorias sobre o capitalismo, precisa-se falar um pouco
sobre o surgimento da necessidade de consumo que o ser humano passou a ter com
o passar do tempo. A grande influência do capitalismo na sociedade consumista
foi na crise de 1929, a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, que
acarretou em uma superlotação de produtos estocados e diversos funcionários
demitidos. Ou seja, não tinha como o mercado continuar sem ter o proletariado
para consumir os produtos, já que os níveis de desemprego estavam altíssimos.
Por causa desse rombo na economia americana, o governo gerou um plano, para
tentar amenizar os danos causados pela crise, o qual foi batizado de “New Deal”
(Novo Acordo). O Novo Acordo fora inspirado nas teorias do economista britânico
John Maynard Keynes, que dedicou várias de suas obras à reflexão dos princípios
liberais de Adam Smith. O plano do governo americano foi de realizar uma grande
remessa de dinheiro que por consequência inflacionou toda a economia. No
entanto, ele também voltou diversos investimentos para o combate do desemprego
e para reaquecer o consumo. Com a facilidade na obtenção de crédito e a
melhoria da renda das pessoas, as empresas viram uma oportunidade de investir
em bons designers para a criação de propagandas que seriam espalhadas pelas
ruas para chamarem atenção do público consumidor. Como também, no investimento
de designer de produto para deixa-lo mais atraente aos olhos do consumidor ao
ver o cartaz. Sem a ajuda do designer e a sua capacidade de influenciar os
olhos do consumidor, a crise de 1929 poderia ter sido bem pior.
Como diziam Valquíria
Padilha, Renata Cristina A. Bonifácio, no Le
Monde Diplomatique, “Para que lucros floresçam,
produtos precisam quebrar mais rápido, tornar-se ultrapassados ou indesejados.
Preço é eterna angústia dos consumidores e devastação da natureza”. A partir
dessa frase pode-se concluir que as estratégias publicitárias e a obsolescência
programada mantêm os consumidores em uma “armadilha” voltada para a aceleração
do ciclo de acumulação do capital. Mészáros (1989, p.88) diz que
vivemos na sociedade descartável que se baseia na “taxa de uso decrescente dos
bens e serviços produzidos”. O instrumento central para o capitalismo ter
sucesso dos seus produtos, com datas para quebrarem, é a publicidade a qual
motiva as escolhas do consumidor. Por isso o papel do designer passa a ser
duplamente mais importante nos dias atuais, pois ele fica responsável pela
persuasão tanto do produto como também da propaganda para convencer o
consumidor da necessidade de produtos supérfluos. Para Latouche (2009, p.18),
“a publicidade nos faz desejar o que não temos e desprezar aquilo que já
desfrutamos. Ela cria e recria a insatisfação e a tensão do desejo frustrado”.
As indústrias aproveitaram a capacidade do designer de
influenciar uma grande massa como uma forma de lucrar ainda mais com os seus
produtos. Desse modo, o design torna-se parte do plano estratégico de negócios
das empresas. E encontra no marketing um parceiro importante para atender aos
interesses do fabricante e do consumidor (Niemeyer, 2002). Com isso, ocorreu o
surgimento do termo obsolescência programada, ou obsolescência planejada, que
seria a produção de mercadorias elaboradas previamente para serem descartadas
logo, ou seja, com um prazo de validade. Isso faz com que o consumidor compre
um novo produto em um tempo menor do que o esperado para aquele produto.
O termo surgiu nos Estados Unidos, nos anos 50, e seria um
meio para estimular um sistema econômico que se baseava na abundância e no
desejo. Devido a competição intensa e cada vez mais crescente entre as
indústrias o marketing e o design surgiram como resposta para aumentar as
vendas. O estilo de vida do consumidor tornou-se um objeto de estudo do
marketing que retirava dados essenciais para a produção em função da lógica de
segmentação de mercado.
Com o aumento do consumismo e a necessidade da indústria, o
designer passou a se dedicar a psicologia do ser humano para influenciá-lo a
consumir mais. Uma teoria bastante interessante sobre esse meio de estudo do
design é apresentada por Norman (2004) a qual fala sobre o comportamento do ser
humano e como funciona o sistema emocional e cognitivo aplicado no design de
produtos. Ela fala sobre três tipos de design que são:
- O design visceral o qual foca na aparência do produto e em
suas características físicas, que seria as cores, formas, odores e texturas.
Essas características desencadeiam um impacto emocional imediato e apela ao
senso estético do consumidor;
- O design comportamental é voltado para o usa e a
experiência com o produto em relação á sua funcionalidade, performance e
usabilidade. Portanto, o designer irá focar no entendimento e a satisfação das
necessidades daqueles que de fato usarão o produto;
- O design reflexivo opera na interação do produto com o
consumidor a qual é afetada pela cultura, educação e diferenças individuais.
Refere-se, então, á autoimagem e ás mensagens que o produto emite sobre quem o
possui;
A constante manutenção na demanda e no aumento das vendas,
através do redesign de objetos, acabam por criar desejos e não necessidades.
Essa manutenção se tornou um dos grandes dilemas presentes na profissão do
designer, já que o único objetivo do mercado é se adequar para o consumidor
comprar mais e mais.
Ademais, vale comentar que a grande escala de produção está
gerando um contexto de grande preocupação em relação ao meio ambiente, tanto a
exploração dos recursos naturais como o descarte dos produtos viram um problema
para as grandes empresas. De acordo com Cardoso (2008), foi apenas no final da
década de 1960 que começou a se difundir os movimentos ambientalistas. A partir
desse momento o design tem uma abordagem maior voltada para o meio ambiente. Só
em 1974 que foi desenvolvida uma das primeiras propostas de design de
reciclados. Uma equipe da Escola Superior de Design de Offenbach, na Alemanha,
criou um sofá a partir de pneus usados para um concurso de Design em Berlim. No
entanto, infelizmente, o produto acabou fracassando por causa das imitações
econômicas.
Dessa maneira, começa a surgir o ecodesign inspirado pelas ideias de
reaproveitamento. Depois o ecodesign vai ganhar uma dimensão maior sendo
associado ao ciclo de vida do produto junto com o conceito de que o final do
ciclo de vida do produto não é o fim da vida do material (NAIME & GARCIA,
2004 e NAIME, 2005). Portanto, “o ecodesign passa a ser o novo marco diretivo
da humanidade para o gerenciamento de qualquer conflito ambiental” (BRUNETTI;
SANT’ANNA, 2003p. 8).
De maneira simplificada, define-se o ecodesign como um projeto voltado
para as questões ecológicas e de sustentabilidade. Os autores Ryn e Cowan (2007),
conceituam design ecológico como “qualquer forma de design que minimize os
impactos destrutivos do meio ambiente através da sua integração com o processo
de viver”. Alguns autores consideram o ecodesign como um requisito para o
desenvolvimento de qualquer projeto, já que com o passar dos anos a matéria
prima vem ficando cada vez mais escassa.
De acordo com Cardoso (2008), o design ambiental vem passando por
diversas fases com visões diferentes. A primeira fase procura criticar o
consumismo moderno, por isso o ecodesign aparece como uma proposta de boicote
ás indústrias com propostas de projetos “faça você mesmo”. No entanto essas
experiências de consumo alternativo não tiveram muito impacto sobre a maior
parte do público consumidor. A segunda fase de preocupação surgiu na década de
1980, e trouxe uma estratégia de consumo de produtos ecológicos ou verdes.
Martirani et al. (2006), caracteriza o consumo verde como o combate ao
desperdício, redução do consumo de recursos naturais e reciclagem de materiais.
Por isso, acaba surgindo um novo tipo de consumidor, na Europa, o qual é mais
consciente e está disposto a pagar mais caro por um produto menos poluente.
Esse novo consumidor incentivou os designers e as empresas a investiram em
projetos mais sustentáveis tanto no destino final do produto como o material
usado.
As ideias de sustentabilidades, atualmente, estão mais voltadas para um
produtor barato e sustentável. Podemos perceber que o mercado vem tentando se
adaptar as leis ambientais, mas ainda não existe uma resposta concreta e bem
formulada com a solução do uso de plástico de maneira desnecessária. Um grande
exemplo disso é a nova lei sobre o uso de canudos plásticos, algumas empresas
não conseguiram se adequar à nova lei e outras estão testando novos produtos
inovadores.
Portanto, a conclusão final do tema é que o capitalismo vem
influenciando o designer desde a Revolução Industrial e por consequência afeta
os meios sociais e, mais recentemente, o meio ambiental. O capitalismo não
sobrevive sem o Design e o Design não sobrevive sem o capitalismo, já que o
investimento na área de pesquisas para a melhoria dos produtos é feito pela
indústria, a qual necessita dos resultados para continuar lucrando. Sem o
design, o capitalismo não teria como movimentar o capital pela compra e venda
de produtos.
Referências bibliográficas
https://periodicos.ufsm.br/reget/article/viewFile/5265/3630
BRUNETTI, M.; SANT’ANNA, F. Ecodesign e a Revisão do Design Industrial
para a Criação de Produtos de Baixo Impacto Ambiental.
22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental.
Joinville, set. 2003.
Cardoso, Rafael. (2004). Uma introdução à história do
design. São Paulo: Edgar Blücher.
Löbach, Bernd (2001). Design industrial: bases para a
configuração dos produtos industriais. São Paulo: Edgar Blücher.
MARTIRANI, L. et al. Sociedade de Consumo e Ambiente: Valores Sociais,
Necessidades Psicológicas e Nova Educação. III Encontro da ANPPAS, Brasília,
DF. Mai. 2006
Texto desenvolvido por Julia Bezerra de Souza Godeiro sob a
orientação do Prof. Dr. Rodrigo Boufleur, para a disciplina Introdução ao
Estudo do Design. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos
sobre Design” (http://estudossobredesign.blogspot.com) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte -
Departamento de Artes - Bacharelado em Design - Novembro de 2018.